Dois advogados meus amigos reagiram de forma pronta e certeira à segunda parte desta mensagem, onde observo que a advocacia terá de cumprir o seu papel no sentido de levar os tribunais a fixarem a indemnização pelo dano morte em valores dignos, ou seja, mais elevados que aqueles que habitualmente são atribuídos, e que apenas o fará se não se coibir de reclamar indemnizações justas em vez de se conformar, por exemplo, com uma indemnização de apenas € 50.000 pela perda do direito à vida de uma criança de 6 anos, cingindo o pedido a tal valor.
A resposta, como dizia, veio pronta e curta: O facto de os advogados não pedirem valores acima da média fixada pelos tribunais tem uma explicação muito simples: as custas judiciais. Se não se litigar com apoio judiciário e o cliente não for rico, é melhor não arriscar, pois o custo da sucumbência pode consumir o valor indemnizatório.
Nada que eu não merecesse ouvir e de que não estivesse à espera…
Lá respondi reconhecendo que eles têm toda a razão, atendendo aos valores proibitivos que atingiram as custas judiciais. Aliás, eu estava a escrever a mensagem em causa e a pensar que qualquer advogado que a lesse pensaria imediatamente algo como: se você pagasse custas, ou tivesse que dizer ao cliente quanto ele vai ter de pagar de custas e visse a cara incrédula dele... Tive plena consciência disso, apenas não quis desviar-me do tema. Aproveito o reparo que me foi feito e trato agora da questão em mensagem autónoma.
Acredito que o legislador também tenha consciência de que o valor astronómico das custas judiciais limita em medida intolerável o acesso aos tribunais e o pleno exercício dos direitos, só que dá prevalência aos números em detrimento da substância, à estatística em detrimento daquilo que realmente interessa, que é a realização da Justiça e, desde logo, o acesso à mesma por todos aqueles que dela necessitam. Não só aqui, mas também aqui. Com efeito, do ponto de vista estatístico, não há dúvida de que, quando mais se dificultar o acesso à Justiça, menor tenderá a ser o número de processos entrados nos tribunais e, a prazo, o número de processos pendentes. O que, politicamente, constitui um trunfo.
Politicamente, cada vez mais apenas a estatística é valorizada. É a tal gestão por objectivos ultimamente muito em voga. Objectivos exclusivamente quantitativos, entenda-se. Interessa é “matar” processos ou, melhor ainda, evitar que eles “nasçam”, fixando as custas judiciais em níveis incomportáveis. Os mais pobres poderão beneficiar de apoio judiciário e os mais ricos podem pagar esse bem de luxo em que o acesso aos tribunais se transformou. Os mais prejudicados são os do costume: a classe média, se é que isso ainda existe.