2013-01-16

Dano morte (4)


Não obstante a já apontada evolução jurisprudencial no sentido do aumento do valor da indemnização pelo dano morte, acredito que ainda não se chegou ao fim desse caminho, isto é, que o valor de € 80.000 ainda poderá ser excessivamente modesto quando está em causa a perda de uma vida humana. Numa ordem jurídica que coloca a vida humana como bem jurídico supremo, avaliar esse bem, em sede de cálculo da indemnização, em apenas € 80.000, ainda poderá ser pouco.

Dir-se-á, em contrário, que, não tendo a vida humana preço, a continuarmos a trilhar este caminho, não mais pararemos, pois o mesmo não tem fim.

Não é assim.

Neste domínio, como noutros em que a busca da solução jurídica do caso concreto assente num juízo de equidade (artigo 496.º, n.º 3, do Código Civil), não podemos deixar de procurar pontos de referência normativos que possam ser considerados aceitáveis. Só a consideração desses pontos de referência, caso existam, permitirá transcender o puro subjectivismo de cada juiz, ainda que balizado pela prática jurisprudencial, e encontrar uma solução que se harmonize com opções do próprio legislador noutros domínios, ainda que aparentemente distantes do instituto da responsabilidade civil extra-obrigacional.

Um ponto de referência que me parece útil é o montante das sanções em quantia (e não em dias, como acontece, no Direito Penal, com a pena de multa) que a lei estabelece no domínio do Direito Contra-Ordenacional. Aí transparece o critério da própria lei no que toca ao valor do dinheiro em função de outros bens jurídicos.

Não ignoro que o instituto da responsabilidade civil tem uma finalidade fundamentalmente (embora não exclusivamente, saliento) de ressarcimento do prejuízo sofrido pelo lesado, ao passo que o Direito Contra-Ordenacional possui uma finalidade sancionatória. Ainda assim, invocar esta diferença para afastar liminarmente o recurso àquele critério para o restrito fim que agora tenho em vista poderá ser um argumento tentadoramente fácil, mas improcedente. Ao apelar ao Direito Contra-Ordenacional, procuro fundamentalmente indagar o que é «muito dinheiro», «pouco dinheiro», ou «a quantia justa» para o legislador. Ou, se quisermos, o valor que este último dá a cada euro, se bem que noutro ponto da ordem jurídica. O que, parece-me, faz sentido e abrirá caminho para decisões mais justas, que é aquilo que se pretende no Direito.