2024-09-06

O regresso da censura (1)

 

Vivemos tempos sombrios em matéria de liberdade de expressão, de liberdade de informar e de direito a ser informado. Pé ante pé e sempre com piedosos pretextos, vão-se criando e expandindo limitações de toda a ordem. Não se pode dizer isto porque é racismo, não se pode dizer aquilo porque é homofobia, transfobia ou outra qualquer fobia desse espectro, não se pode dizer aqueloutro porque é xenofobia ou discurso de ódio, e assim por diante.

Este tipo de rotulagem da opinião divergente tem feito as vezes do antigo lápis azul na perfeição. Por via dela, a referida opinião passa de meramente divergente a proibida. Proibição essa a que tem vindo a ser conferida tutela penal e contraordenacional. Discordar passa, cada vez mais facilmente, a constituir um ilícito criminal ou contraordenacional.

Entretanto, o princípio da intervenção mínima do Direito Penal parece ter sido mandado às urtigas. A construção da «sociedade do bem» (mais uma...) não pode prescindir da utilização, pelo Estado, do seu mais contundente meio coercivo, que é a tutela penal de toda uma panóplia de novos bens jurídicos.

A extensão de termos como «racismo», «homofobia», «xenofobia», «discurso de ódio» e outros ao serviço da mesma causa tem vindo a ser ampliada a tal ponto que, para os sensíveis ouvidos dos novos polícias da palavra, já lá cabem realidades que, racionalmente, nada têm a ver com as etiquetas que estes lhes colam.

A partir do momento em que se conseguiu a criminalização de comportamentos através da inclusão, em tipos penais, de conceitos tão vagos como os de «racismo», «ódio», «xenofobia» ou «homofobia», o esforço dos prosélitos do wokismo passou a ser o de os hipertrofiar, neles incluindo, em toda a medida que caiba nas suas férteis imaginações, o que divergir das suas bizarras teorias. Se, no limite, conseguirem proibir toda a opinião divergente, ficarão dispensados de contra-argumentar.

Não obstante, nada sacia essa gente, que permanentemente inventa novas modalidades de «discriminação», de «ofensa», de «incitamento ao ódio», com a inerente proliferação de limitações à liberdade de expressão. Quantos mais grupos de «vítimas» de discriminações e ofensas várias e de imaginados discursos de ódio forem inventados, maior será o rebanho e, em consequência, o poder dos seus pastores, protectores e guias espirituais.

Do lado do cidadão comum, o efeito é precisamente o pretendido. Como a generalidade das pessoas já tem problemas que cheguem e não quer arranjar mais, surge, em todo o seu esplendor, a auto-censura. Na dúvida, é melhor não dizer o que se pensa sobre os novos «temas proibidos», não utilizar «palavras proibidas», não opinar contra a «ditadura do bem». O «está calado, que isso não se pode dizer», do tempo do Estado Novo, regressou em força, embora sob bandeira diversa. Pela mão dos «activistas», «progressistas», «anti-fascistas» e outras designações simpáticas que eles a si próprios atribuem. E, lamentavelmente, com a cobarde complacência dos que, embora não o sendo, a eles se vergam.

Perante isto, o mínimo que cada um tem o dever de fazer em defesa da liberdade de expressão é exercê-la plenamente.