2011-09-05

ESTATUTOS ESPECIAIS

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Andava eu a rever algumas noções de direitos fundamentais quando encontrei uma referência interessante a um tema que se tem revelado especialmente atreito a episódios de poluição jurídica: o dos direitos e deveres dos cidadãos com estatutos especiais. 
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Porque acredito que a poluição jurídica se combate através daquilo que constitui a sua antítese (e, espero, antídoto), ou seja, a ciência jurídica, aqui fica um bocadinho desta. São excertos do Direito Constitucional de J. J. GOMES CANOTILHO (5.ª edição, páginas 636 a 639; ver também páginas 634 e 635). Decididamente, é tempo de os juristas largarem os jornais e regressarem aos livros.
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Passo a citar:
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“(…) há outras pessoas que se encontram numa situação especial geradora de mais deveres e obrigações do que aqueles que resultam para o cidadão como tal. Referimo-nos às chamadas relações especiais, tradicionalmente designadas por relações especiais de poder (ou até estatutos de sujeição). Como exemplos referem-se as situações dos funcionários públicos, dos militares, dos presos, etc.
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(…) as relações especiais de poder serão susceptíveis de originar problemas de ordenação entre direitos fundamentais e outros valores constitucionais. Eles deverão ser resolvidos à luz dos direitos fundamentais mediante uma tarefa de concordância prática e de ponderação possibilitadora da garantia dos direitos sem tornar impraticáveis os estatutos especiais.
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(…) os cidadãos regidos por estatutos especiais não renunciam a direitos fundamentais (irrenunciabilidade dos direitos fundamentais) nem se vinculam voluntariamente a qualquer estatuto de sujeição produtor de uma capitis diminutio. Trata-se tão-somente de relações da vida disciplinadas por um estatuto específico. Este estatuto, porém, não se situa fora da esfera constitucional, não é uma ordem extraconstitucional. É um estatuto heteronomamente vinculado, devendo encontrar o seu fundamento na Constituição (ou estar pelo menos pressuposto). As restrições de direitos fundamentais justificadas com base numa relação especial de poder, mas sem fundamento na Constituição, serão, consequentemente, inconstitucionais.”
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