2025-07-10
Segurança dos reclusos
2025-07-08
Fuga da prisão de Alcoentre
2025-01-02
Relatório sobre o sistema prisional e tutelar
Artigo 299.º da Lei n.º 45-A/2024,
de 31.12 (Orçamento do Estado para 2025):
(Actualização do relatório
sobre o sistema prisional e tutelar)
1 - Até ao final do primeiro
trimestre de 2025, o Governo actualiza o relatório sobre o sistema prisional e
tutelar «Olhar para o futuro para guiar a acção presente — Uma estratégia plurianual
de requalificação e modernização do sistema de execução de penas e medidas
tutelares educativas», e faz um balanço da sua execução.
2 — O relatório referido no
número anterior deve ser apresentado publicamente até ao final de Abril de
2025.
2024-10-25
Prisões: o preço a pagar
É claro que isto terá enormes custos, materiais e políticos.
Contará, seguramente, com a
oposição daqueles que, por cegueira ideológica ou interesses mais prosaicos, rejeitam
sistematicamente qualquer solução que aumente a eficácia do sistema de justiça
penal, de que o sistema prisional constitui um elemento fundamental.
Lá virá a habitual «poesia jurídico-penal», linda de
recitar mas absolutamente desfasada da realidade, cujo mote preferido é o mais
que estafado argumento de que se deve apostar na «ressocialização» e não na prisão, como se a colocação destes dois
termos em alternativa fizesse algum sentido.
Lá virá a queixa de que os tribunais
portugueses aplicam demasiada prisão, seja a título de pena ou de medida de
coacção, com a inerente proposta de alterações legislativas que limitem mais e
mais tal possibilidade.
E lá virá, como proposta de «solução» para os problemas do nosso sistema prisional, a continuação destas práticas, assim deixando tudo na mesma.
Em suma, a reforma do
sistema prisional que se impõe implicará sobrepor decididamente o interesse
nacional ao interesse partidário. O que, como se sabe, não é para todos os
estômagos políticos.
2024-10-21
Prisões: por que ponta pegar?
O sistema prisional de um
país não passa de um elemento, fundamental é certo, do sistema de justiça
penal. Deve, por isso, ser configurado de forma a adequar-se ao cumprimento dos
fins que a lei penal aponta à pena de prisão.
Por aquilo que aqui afirmei,
o Direito Penal português precisa de ser repensado, se se quiser que ele volte
a ser levado a sério. O que, a acontecer, teria de se repercutir sobre a
configuração do sistema prisional.
Porém, não podemos estar à
espera disso, desde logo porque é altamente improvável que haja lucidez, saber,
vontade e coragem para empreender tal tarefa. O estado deplorável a que o poder
político deixou o sistema prisional chegar impõe urgência na tomada de medidas «mínimas» que evitem que este entre em
ruptura.
Por onde pegar, então, neste
imenso problema?
Por aquilo que se mostre
necessário em qualquer quadro jurídico-penal. A saber, aumentar a capacidade do
sistema prisional, reforçar a segurança das prisões e melhorar substancialmente
as condições em que os reclusos cumprem as suas penas. Ou seja, construir novas
prisões, adequadas às actuais exigências, e reabilitar as existentes. E com
urgência. Para mais quando o encerramento do Estabelecimento Prisional de
Lisboa, que é o que alberga o maior número de reclusos em Portugal, está para
breve.
Já não existe margem para mascarar
o problema com os truques habituais. A evolução
da criminalidade no nosso país não se compadece com a reiteração da concessão
de medidas de clemência, ou com sucessivas alterações legislativas de pendor
laxista, entenda-se, cada uma mais laxista que a anterior. Laxismo sobre
laxismo só poderá conduzir à falência do Estado enquanto garante da segurança
pública e protector dos mais fracos contra a violência dos mais fortes. Quando
o Estado recua no combate ao crime, é este que avança, ocupando o território por
aquele deixado livre. Em vez disso, impõe-se reafirmar a autoridade do Estado, com
a maior firmeza possível.
2024-10-20
Eloquentes omissões
Se há omissões plenas de significado,
são aquelas que se verificam perante situações de evidente emergência. Se quem
tem o dever de zelar pelo bom funcionamento de determinada realidade nada fizer
no sentido de resolver situações dessa natureza que nesta ocorram, estará a
demonstrar que não reconhece a sua existência ou, ao menos, a sua importância.
A menos que seja tão louco ou incompetente que, reconhecendo embora tais
existência e importância, confie que o problema se resolverá por si próprio. Ou
tão destituído de escrúpulos que, por ocupar o cargo que lhe impõe aquele dever
de zelo de forma meramente temporária, funde a sua inércia na expectativa de
que, quando a coisa estoirar, já estará noutras paragens.
Pois bem, há cerca de 50
anos que o poder político omite ostensivamente o seu dever de cuidar do sistema
prisional português, não obstante a magnitude dos problemas que este vem apresentando.
Como aqui
e aqui
afirmei, o poder político tem-se limitado a ir gerindo a crise, empurrando os
problemas com a barriga. Quando, por efeito dessa omissão das medidas que se
impõem, a pressão dentro do sistema é de tal ordem que o perigo de explosão se
torna iminente, o poder político inventa um pretexto para conceder uma amnistia
e um perdão de penas, assumidos ou encapotados. Uma vez aliviada a pressão por
meio destes expedientes, o poder político não volta a pensar no assunto até que a pressão volte a subir a níveis demasiadamente perigosos,
o que, em princípio, só ocorrerá dali a alguns anos, quando a batata quente já
estiver nas mãos de outros. Nunca o poder político conseguiu fazer melhor que
isto.
Esta omissão é inadmissível,
vergonhosa e imperdoável.
Se, diante de um incêndio,
um corpo de bombeiros, em vez de procurar extingui-lo, cruzasse os braços e
deixasse arder, seria crucificado. O mesmo aconteceria a um nadador-salvador
que, diante de um banhista em risco de afogamento, nada fizesse.
Já os políticos que, no
último meio século, deixaram os problemas do sistema prisional avolumar-se diante
dos seus olhos sem esboçarem qualquer tentativa séria e consistente de os
resolver e, muitas vezes, ainda se atrevendo a debitar discursos completamente
desfasados da realidade para tentarem esconder a sua incompetência e o seu
desleixo, como o de que a causa dos problemas do sistema prisional é os juízes
decretarem demasiadas prisões preventivas, proferirem demasiadas condenações em
penas de prisão efectiva e estenderem estas por tempo excessivo, nunca foram
chamados a responder (politicamente, claro) pelos seus erros e omissões. Seria
justo e, seguramente, pedagógico que o fossem, mas é claro que isso nunca irá
acontecer. Este tipo de escrutínio não faz parte dos nossos hábitos.
Da descrita omissão, que se
traduziu num verdadeiro «deixa arder»,
ou «deixa afogar», aquilo que
resulta, com toda a clareza, é uma absoluta incapacidade e falta de vontade
política para resolver os problemas do sistema prisional por parte de
quem governou o nosso país no último meio século. Trata-se, pois, de uma
omissão verdadeiramente eloquente.
2024-09-23
Bipolaridade jurídico-penal
No rescaldo de mais uma trágica vaga de
incêndios florestais, são muitas as vozes que reclamam a imediata aplicação de
prisão preventiva a tudo o que for suspeito de ser incendiário e a sua ulterior
condenação em pesadas penas de prisão efectiva, manifestando indignação por uma
alegada brandura dos tribunais nesta matéria, nomeadamente por suspenderem a
execução das penas de prisão numa percentagem excessiva de casos.
Há até quem sustente que, no início de
cada época de incêndios, se deveria prender os «incendiários habituais» antes de
estes entrarem em acção. Tanto quanto consegui perceber, tratar-se-ia de uma
espécie de «prisão ultra-preventiva»,
que anteciparia, não apenas o trânsito em julgado de uma decisão condenatória,
mas a própria prática do crime.
Pela minha parte, concordo com a condenação
dos incendiários em penas severas, desde que justas, e com a aplicação de
prisão preventiva quando os respectivos pressupostos legais se verificarem, nunca
esquecendo, porém, que um deles é a existência de fortes indícios da prática do
crime, coisa que, no calor do momento, tende a ser menosprezada por quem clama
por «justiça firme e pronta». Já a «prisão ultra-preventiva» apenas poderá terá
lugar num «anedotário jurídico-penal».
Registo, porém, que muitos daqueles que agora
reclamam, dos tribunais, «mão pesada»
em relação aos incendiários, são os mesmos que, uma vez apagados os incêndios,
clamam que há presos a mais em Portugal, que os tribunais aplicam demasiada
prisão preventiva e demasiadas penas de prisão efectiva e que estas são
excessivamente longas.
São também os mesmos que, fora da época
de incêndios, se dizem contra a pena de prisão porquanto há que apostar é na
ressocialização, como se se tratasse de realidades antinómicas.
Aguardemos, pois, que, com a entrada do Outono, os hoje fogosos adeptos da «mão pesada» percam o gás. Não tarda, voltarão à habitual conversa mole dos «presos a mais» e da «ressocialização em vez de prisão». Também a este filme, já assisti vezes demais.
2024-09-11
A execução de penas segundo Carlos Rato
Um efeito colateral da fuga
de Vale de Judeus tem sido a passagem, pelos canais de televisão, de pessoas
que, mal abrem a boca, revelam a sua ignorância sobre aquilo de que falam. Por
vezes, uma arrogante ignorância.
Foi o caso de Carlos Rato,
Director da APAR – Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso, em entrevista à
SIC.
Transcrevo um curto excerto:
«Nas
prisões, um dos grandes problemas que existem são os juízes de execução de
penas. Temos aqui um problema gravíssimo. Temos na execução de penas pessoas
que estão lá porque ficaram no final da classificação, são os últimos da lista
de juízes. Quem não consegue entrar para mais lado nenhum, vai para juiz de
execução de penas. Quando as pessoas que são juízes de execução de penas não
estão preparadas ou vocacionadas para fazer isso, claro que depois temos as
penas maiores da Europa em execução. Temos as cadeias cheias de gente que não
tem carta de condução.»
É notável conseguir-se errar
tanto com tão poucas palavras.
1.º - É rotundamente falso
que os juízes de execução de penas o sejam por se encontrarem no final da «lista de juízes» (Carlos Rato tem
certamente em vista a lista de antiguidade dos magistrados judiciais, que pode
ser consultada no site do Conselho Superior da Magistratura). Numa rápida
consulta à lista mais recente, respeitante ao ano de 2023, contei 4 juízes de
execução de penas entre os 100 primeiros juízes de direito, nomeadamente a
minha colega que, segundo tem sido noticiado, proferiu a decisão que terá determinado
a transferência de um dos fugitivos do Estabelecimento Prisional de Monsanto
para o de Vale de Judeus. Já entre os 100 juízes de direito constantes do final
daquela lista, não vi qualquer juiz de execução de penas. Resta esclarecer que
constam da lista 1398 juízes de direito.
2.º - Não são os juízes de
execução de penas que condenam os reclusos nas penas que estes cumprem. Os
juízes de execução de penas limitam-se a proferir decisões respeitantes à fase
de execução das penas de prisão em que outros juízes, colocados noutros
tribunais, condenaram os reclusos. Nada têm a ver com a natureza e a medida das
penas em que os reclusos foram condenados, nomeadamente com a duração das penas
de prisão.
Portanto, Carlos Rato errou em
toda a linha. Nem os juízes de execução de penas são «os últimos da lista», nem, ainda que o fossem, isso poderia ter
qualquer influência na duração das penas que os reclusos cumprem. Ou seja,
tratou-se de mais um episódio de poluição jurídica.
Sobre a alegação de que «temos as penas maiores da Europa em
execução» e de que «temos as cadeias
cheias de gente que não tem carta de condução», que também ouvi, por estes
dias, a Vítor Ilharco, secretário-geral
da APAR, escreverei um dia destes.
2024-09-10
Como mascarar os problemas do sistema prisional
Escrevi aqui que, ao longo
dos últimos 50 anos, o poder político se tem limitado a «gerir a crise» e a empurrar com a barriga os problemas do nosso
sistema prisional, em vez de os resolver. Pior, especializou-se em mascará-los.
O expediente para o efeito
mais utilizado tem sido a concessão de amnistias e perdões de penas quando a
pressão resultante da sobrelotação das prisões se torna insuportável,
colocando-se em liberdade, de um dia para o outro, algumas centenas de
reclusos. As visitas papais a Portugal são o pretexto preferido, mas até a
Covid-19 serviu para conceder um perdão de penas encapotado.
Noutras ocasiões, a máquina
político-mediática é posta em marcha no sentido de espalhar a ideia de que há
demasiados presos em Portugal. Uma vez preparado, dessa forma, o terreno, sai
uma alteração da legislação penal que tem por efeito a imediata libertação de mais algumas centenas de reclusos. A «Reforma Penal de 2007» foi um flagrante exemplo disso. Embora não assumido (obviamente…),
um dos objectivos centrais dessa reforma foi esvaziar prisões, fosse a que
preço fosse, como em devido tempo salientei:
- Objectivo: esvaziar prisões (1) – link
- Objectivo: esvaziar prisões (2) – link
- Objectivo: esvaziar prisões (3) – link
A enfrentar os reais problemas do sistema prisional, reformando-o de alto a baixo, é que todos têm fugido. É complicado, é demorado, requer investimentos significativos e, ainda por cima, não dá votos.
2024-09-08
A propósito da fuga de Vale de Judeus
Ontem de manhã, evadiram-se do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, classificado como de alta segurança, 5 reclusos, 4 dos quais considerados muito perigosos. Saltaram o muro e foram às vidas deles, sem oposição e sem serem, sequer, detectados por quem os guardava.
A comunicação social não
fala de outra coisa desde que a fuga foi conhecida. Subitamente, toda a gente
acordou para o facto de as prisões, à semelhança da generalidade dos restantes
sectores do Estado Português, se encontrarem numa situação de ruptura.
Sobrelotadas, em péssimas condições, com um número insuficiente de guardas
prisionais e com graves falhas de segurança.
Os problemas do sistema
prisional não são de hoje, nem do último ano, nem sequer dos últimos 10 anos.
Nos últimos 50 anos, o sistema prisional tem sido, pura e simplesmente, desprezado
pelos sucessivos governos. O país vive de costas voltadas para as suas prisões,
fingindo que elas não existem, e só se lembra delas quando ocorre uma evasão
mais aparatosa, como a de ontem, ou quando algum cidadão mais ilustre é preso.
O mesmo tem feito o poder político, que, em vez de enfrentar os inúmeros
problemas existentes, se limita a «gerir
a crise», empurrando os problemas com a barriga. É assim há 50 anos, repito.
Enfim, pode ser que seja
desta que o país acorde para a gravíssima situação das nossas prisões.
Plagiando o «Manifesto dos 50», que
obviamente se concentra em questões mais selectas que a do sistema prisional,
pode ser que se verifique um «sobressalto
cívico» que leve o Estado Português a, 50 anos depois, voltar a cuidar das
suas prisões.