Apesar do cepticismo que expressei na mensagem anterior, deixo uma sugestão: comecem por avaliar o actual Código Penal.
O critério decisivo para avaliar se uma lei é boa ou má, eficaz ou ineficaz, só pode ser o da sua adequação à realidade social que visa regular. Tratando-se de uma lei penal, as vertentes fundamentais por que passa aquele juízo são duas: manutenção de níveis de criminalidade baixos com respeito pelos direitos fundamentais. O equilíbrio entre estas duas vertentes constitui o ideal de qualquer sistema penal de um Estado de Direito Democrático. De forma muito simplificada, descurar a primeira é cair no laxismo; descurar a segunda equivale a enveredar pelo securitarismo.
A esta luz, um bom ponto de partida para a avaliação do actual Código Penal seria comparar os níveis de criminalidade de 1982 com os dos anos ulteriores, até à actualidade.
Depois, seria só avaliar coisas básicas como, por exemplo:
- O efeito inibidor da reincidência (em sentido amplo) de cada uma das diversas espécies de penas que aquele código estabelece (sobre este assunto, já aqui escrevi);
- Se o regime cada vez mais generoso (para o condenado, claro está) da liberdade condicional produz algum efeito ressocializador ou, em vez disso, serve apenas para ir aliviando a pressão sobre um sistema prisional com um permanente problema de sobrelotação;
- Se o também generoso (mais uma vez para o condenado) regime do cúmulo jurídico de penas produz o efeito ressocializador que os seus defensores lhe atribuem, ou não passa, afinal, de mais um expediente para reduzir o tempo de prisão;
- Enfim, se a crença aparentemente ilimitada na possibilidade de ressocialização do delinquente (entenda-se, de todos os delinquentes, sem excepção), que está na base de opções legislativas em matérias fundamentais, tem correspondência na realidade da vida ou, ao contrário, não passa de uma falácia em que alguns ingenuamente acreditam e outros fingem acreditar com objectivos bem prosaicos mas politicamente difíceis de assumir.
Os resultados de uma tal avaliação, se esta fosse digna desse nome, seriam certamente interessantes. Lá teriam de ir mais algumas bibliotecas para o lixo, provavelmente.