2011-10-05

ACIDENTE DE VIAÇÃO EM AUTO-ESTRADA (3)

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Foi no contexto referido na mensagem anterior que surgiu a Lei n.º 24/2007, de 18 de Julho, cujo artigo 12.º tomou posição na querela aí descrita, no sentido da atribuição, à concessionária, do ónus da prova do cumprimento das suas obrigações de segurança. 
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É a seguinte a redacção do n.º 1 desse artigo: 
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Nas auto-estradas, com ou sem obras em curso, e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito a:
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a) Objectos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem;
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b) Atravessamento de animais;
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c) Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais.
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Portanto, numa hipótese como aquela que configurei na mensagem anterior, a alínea b) do n.º 1 deste artigo parece não deixar dúvidas: o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária. Solução esta que me parece ser a mais justa porque, dada a flagrante desigualdade de recursos e, mais especificamente, de capacidade de acesso a informação relevante para o apuramento das circunstâncias do acidente, entre o utente e a concessionária, o primeiro, se ficasse onerado com o ónus da prova de todos os pressupostos da responsabilidade civil, incluindo do incumprimento, pela segunda, das suas obrigações de segurança, teria a seu cargo uma missão quase impossível.
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Poderá discutir-se se a referida tomada de posição do legislador directamente sobre a distribuição do ónus da prova envolve alguma opção sobre a natureza da responsabilidade – contratual ou extracontratual – da concessionária por danos resultantes de acidente de viação ocorrido em auto-estrada concessionada. É questão irrelevante para a resolução da situação enunciada na mensagem anterior. Aquilo que é relevante, ou seja, a distribuição do ónus da prova, é claro. Apesar disso, direi que me parece que o artigo 12.º da Lei n.º 24/2007 optou pela tese da responsabilidade extracontratual, pois só assim se compreende que tenha disposto directamente sobre o regime do ónus da prova nos termos em que o fez. Trata-se de mais um regime excepcional nesta matéria, a par de outros, como os dos artigos 491.º a 493.º do Código Civil. 
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Ficou assim o problema resolvido?
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Claro que não. Voltamos à mesma: o Direito é complexo e resolver um problema é, tantas vezes, abrir a porta a outro. Discute-se agora se o artigo 12.º da Lei n.º 24/2007 tem natureza interpretativa. Lá iremos.
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