.
Regressemos ao artigo 12.º da Lei n.º 24/2007, agora munidos com os ensinamentos dos dois Mestres que citei na mensagem anterior.
Como já referi, esta norma surgiu no contexto de uma discussão que, sem exagero, pode ser considerada das mais acesas dos anos que a precederam em matéria de responsabilidade civil, quer na doutrina, quer na jurisprudência. A mesma norma resolveu expressamente o problema num dos sentidos que eram defendidos. É, pois, «flagrante a tácita referência da nova fonte a uma situação normativa duvidosa preexistente», como exige JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO. Ao «fixar uma das interpretações possíveis da LA com que os interessados podiam e deviam contar,» ao «consagrar uma solução que os tribunais poderiam ter adoptado» uma vez que se situa «dentro dos quadros da controvérsia», a mesma norma «não é susceptível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas», como refere J. BAPTISTA MACHADO.
Por tudo isto, parece-me impor-se a conclusão de que o artigo 12.º da Lei n.º 24/2007 tem natureza interpretativa do Direito anterior. Logo, «integra-se na lei interpretada», nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil.
O efeito prático deste entendimento é evidente: Ainda que este acidente tivesse ocorrido antes da entrada em vigor da Lei n.º 24/2007, o regime do artigo 12.º desta última ser-lhe-ia aplicável, cabendo, assim, à concessionária o ónus de alegação e prova de factos demonstrativos de que cumpriu as suas obrigações de manutenção da segurança da via.
Ou seja, é «apenas» a diferença entre a procedência e a improcedência da acção de indemnização movida contra a concessionária, entre conseguir o ressarcimento dos danos sofridos com o acidente e, em vez disso, não receber um cêntimo por mais graves que esses danos sejam, que pode estar em causa.
Como era de esperar, não há consenso sobre a questão de saber se o artigo 12.º da Lei n.º 24/2007 tem natureza interpretativa. Assim, por exemplo, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09.09.2008 (processo n.º 08P1856) e de 08.02.2011 (processo n.º 8091/03.6TBVFR. P1.S1) e do Tribunal da Relação de Lisboa de 24.03.2011 (processo n.º 1633/05.4TBALQ.L1-8) decidiram no sentido que acima defendi, mas o Acórdão da Relação do Porto de 28.09.2010 (processo n.º 803/2001.P1) decidiu em sentido oposto.