2006-08-27

Explosivos com controlo deficiente


A ligeireza com que Portugal lida com o perigo não pára de me surpreender. Num mundo cada vez mais perigoso, com cada vez mais meios para uma única pessoa causar danos imensos e cada vez mais gente disposta a fazê-lo, não podemos continuar a brincar com o fogo. Desta vez, está em causa o controlo dos explosivos:





2006-08-25

Para a História do Direito Penal Português


Nem sempre é necessário atravessar meio mundo para conhecer experiências legislativas exóticas.

Em tempo de crise, nada como ir para fora cá dentro... apenas recuando uma geração.

Aqui fica o link para o SEXO DOS ANJOS, onde é recordada uma pérola do Direito Penal Português - a Lei n.º 8/75, de 25 de Julho.

Chamo a atenção para o art. 12.º - um verdadeiro ovo de Colombo para o problema do excesso de pendência processual.

2006-08-16

Limite máximo da pena de prisão (continuação)


No artigo de opinião reproduzido no post anterior, para se sustentar a tese de que em caso algum o limite máximo da pena de prisão (ainda que resultante de cúmulo jurídico) deve exceder 25 anos, recorre-se a um argumento que não me parece válido.

Afirma-se que ir além dos 25 anos de prisão se afigura, se não impossível, pelo menos muito duvidoso, visto que a partir dos 30 ou 35 anos, a pena de prisão se aproxima do tempo de esperança de vida do condenado e tende a equivaler, na prática, à prisão perpétua.

Não me parece que assim seja.

Desde logo, importa ter em conta que, por aplicação das normas do Código Penal que fixam os parâmetros dentro dos quais as penas concretas (incluindo as penas unitárias resultantes de cúmulos jurídicos de penas parcelares) devem ser fixadas, raramente as mesmas coincidem com o limite máximo. Na prática, a regra é a graduação das penas bem abaixo dos 25 anos de prisão, mesmo para os crimes mais graves, como o homicídio qualificado.

Mas mais importante do que isso é o facto de, no nosso ordenamento jurídico, as penas longas de prisão não serem cumpridas no interior de um estabelecimento prisional até ao fim - bem antes disso, pode e, a partir de certa altura, deve ser concedida a liberdade condicional ao condenado. Logo, uma pessoa condenada em 25 anos de prisão não passa - nem de perto, nem de longe - 25 anos na prisão. E se a pena concreta for de 20 anos de prisão, o condenado poderá ser libertado ao fim de pouco mais de 10 anos...

Em face disto, dizer-se que, a partir dos 30 ou 35 anos, a pena de prisão se aproxima do tempo de esperança de vida do condenado e tende a equivaler, na prática, à prisão perpétua, não é correcto. Mesmo nessa hipótese, sendo a esperança de vida em Portugal de cerca de 70 anos e num sistema que admite a liberdade condicional com a latitude do nosso, o argumento em análise só seria procedente se a média de idades dos reclusos no momento em que iniciam o cumprimento das penas andasse pelos 50 anos... quando, na realidade, andará na casa dos 20 e poucos anos.

Resta-me concluir dizendo, não só que o argumento da equivalência prática de uma pena de prisão superior a 25 anos à prisão perpétua não colhe, mas, mais do que isso, que me parecem existir fortes razões para ir além desse limite em algumas hipóteses de cúmulo jurídico de penas.

Todavia, como este post já vai longo, deixo isso para outro dia.

Limite máximo da pena de prisão


O artigo que em seguida transcrevo foi publicado no CORREIO DA MANHÃ de 23.07.2006. Aborda uma problemática da maior importância, para juristas e não juristas. No post seguinte, direi alguma coisa sobre o assunto.

«Seja qual for a escala de penas, ninguém pode ser executado ou encarcerado por toda a vida duas vezes.

Uma pessoa mata outra por motivo fútil, ódio racial ou para dissimular uma violação. Em Portugal, pode ser condenada a 25 anos de prisão. Mas admitamos que pratica, em circunstâncias idênticas, dois, três ou mesmo 100 homicídios. A pena máxima não se altera. Ora, esta equiparação gera uma desigualdade óbvia e um “desconto” grotesco: quem matar vários seres humanos só será punido pela morte de um. Por outro lado, quem já tiver matado não encontrará estímulo para evitar a “reincidência”.

Tudo isto parece resultar da consagração do limite máximo de 25 anos de prisão. Tal limite vale para os crimes mais graves – como o homicídio qualificado –, surjam eles isolados ou em série.

Além disso, o Código Penal não prescreve a soma pura e simples de penas. O tribunal pode aplicar ao arguido punição inferior a essa soma, desde que não fique aquém da pena fixada para o crime mais grave de entre os que ele cometeu.

Entre nós, sempre vigorou o regime do “cúmulo jurídico” e seria inconstitucional promover a soma das penas, devido à proibição de prisão perpétua. Ainda assim, o caminho percorrido num passado recente aponta para a agravação da responsabilidade. Desde 1995, comina-se a pena máxima de 25 anos para todos os casos de concurso, ainda que sejam pouco graves os crimes que o integram. Ir mais longe afigura-se, se não impossível, muito duvidoso, visto que a partir dos 30 ou 35 anos a pena de prisão se aproxima do tempo de esperança de vida do condenado e tende a equivaler, na prática, à prisão perpétua.

Nos EUA (e outrora na vizinha Espanha) os tribunais aplicam penas de prisão muito superiores à duração da vida humana e até condenam um só arguido a várias penas de prisão perpétua. Vigora o “cúmulo material”, ou seja, adicionam-se as penas sem qualquer restrição.

Ora, não deveríamos nós seguir este exemplo e substituir o “cúmulo jurídico” pelo “cúmulo material”? E não seria avisado abolir (ou pelo menos elevar) o limite de 25 anos de prisão?

Seja qual for a escala de penas, é impossível estabelecer diferenciações nas hipóteses mais graves. Ninguém pode ser executado ou encarcerado por toda a vida duas vezes. Nem sequer a lei de Talião, tomada à letra (olho por olho, dente por dente), permite responder com a mesma moeda a quem praticar vários crimes. De nada servirá, por conseguinte, revogar ou elevar o limite geral de 25 anos de prisão.

E convém não esquecer que esse limite (ou outro muito semelhante) é imposto pela Constituição, que proíbe a prisão perpétua em nome da essencial dignidade da pessoa e de uma aposta firme na reintegração social do agente do crime.»

Rui Pereira, Professor de Direito e presidente do OSCOT

2006-08-14

Segurança dos juízes


Foi recentemente notícia uma agressão cometida contra uma juíza de direito por um indivíduo que esta condenara anos atrás. Tratou-se, ao que tudo indica, de um acto de vingança por aquela condenação.

Este evento veio chamar a atenção, pelo menos durante o «prazo de validade» da notícia (que é muito curto, como se sabe), para o problema da segurança pessoal dos juízes.

A profissão de juiz comporta riscos por vezes elevados, sobretudo – embora não exclusivamente – na 1.ª instância e quando se possui competência criminal.

Por vezes, os condenados e/ou os seus familiares mais próximos reagem com violência à aplicação de penas de prisão efectiva.

Presenciei duas ou três situações dessa natureza no Tribunal Judicial de Évora há meia dúzia de anos e fui alvo de uma outra, após ter lido um acórdão em que foram aplicadas penas de prisão a dois arguidos: fui esperado por várias dezenas de – penso eu – familiares destes últimos e, mal saí do tribunal, se não fosse o pronto auxílio da GNR – que me escoltou até ao meu automóvel e, depois, durante uma parte do caminho até à comarca onde teria um julgamento em seguida –, ter-me-ia visto numa situação muito complicada.

Ameaças a juízes, umas veladas e outras explícitas, na sequência de condenações penais, são cada vez mais vulgares.

Não tenho dúvidas de que a tendência é para as coisas piorarem.

Cada vez mais, mais pessoas se acham no direito de recorrerem à ameaça e, mesmo, à violência quando alguma coisa não lhes agrada e não é só – nem tanto – contra juízes: que o digam polícias, funcionários judiciais, professores, médicos, enfermeiros, técnicos de serviço social, entre outros.

O problema da segurança pessoal dos juízes tem, pois, de ser encarado com seriedade e cabe-nos mantê-lo na ordem do dia, para que seja resolvido antes que ocorram males maiores.

2006-08-13

Criminalidade violenta cresceu 10% no 1.º semestre de 2006

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A notícia já tem 3 dias, mas mantém-se, obviamente, actual.

Os dados agora revelados não podem deixar de ser tidos em conta por todos aqueles que se ocupam do Direito Penal.

O artigo é da autoria da jornalista Tânia Laranjo e foi publicado no «Público» do passado dia 10.

Aqui fica (os destaques são da minha autoria):

«A criminalidade violenta e organizada (onde se incluem os assaltos a dependências bancárias, casas de câmbio, carrinhas de valores, postos de correios e prospectores bancários) aumentou 10,5 por cento no primeiro semestre deste ano, comparativamente a igual período do ano passado.

O salto mais significativo registou-se em Lisboa e em Setúbal, onde o crescimento foi de 45 por cento.

Também o número de detidos aumentou, tal como a taxa de resolução destes crimes, da exclusiva responsabilidade da Polícia Judiciária (PJ).

No que se refere apenas a assaltos a bancos, o aumento é ligeiramente menor. No primeiro semestre de 2005, tinha havido 52 roubos daquela natureza e, em 2006, foram 57 (o que representa um aumento de 9,6 por cento).

A maioria destes crimes terá sido cometida por estrangeiros, que se encontravam em situação irregular no país, sendo que uma boa parte deles é proveniente da América do Sul.

Os dados são da Direcção Central de Combate ao Banditismo da PJ, que ontem desmantelou mais um grupo alegadamente responsável por 20 assaltos a bancos, feitos nos últimos três meses (ver texto em baixo).

Com o esclarecimento desses casos (que representam 25 por cento do total de assaltos a bancos nos sete primeiros meses deste ano), dispararam as taxas de resolução dos crimes no primeiro semestre para totais que, para já, ainda não estão quantificados.

Taxas de esclarecimento do crime aumentaram

A criminalidade violenta e organizada tem vindo a aumentar nos últimos anos.

No final de 2005, o crescimento relativo a 2004 era de 30 por cento.

A par com este aumento, têm crescido também as taxas de resolução destes crimes por parte da Judiciária.

No final de 2005, a taxa de esclarecimento era de 52 por cento (mais de metade dos 217 assaltos daquela natureza foram resolvidos), tendo os números aumentado no primeiro semestre deste ano mais 15 por cento, relativamente a igual período no ano anterior.

Na Secção Regional de Combate ao Banditismo da Polícia Judiciária do Porto, encontrava-se a maior taxa de resolução no final do primeiro semestre, com os números de crimes esclarecidos a ultrapassarem os 75 por cento.

No entanto, mais de metade dos assaltos a bancos que ocorreram no país aconteceram na zona de Lisboa.

Relativamente ao número de detidos, verifica-se também um crescimento dos valores nacionais. Os dados dão conta de um aumento de 46 por cento no primeiro semestre deste ano, sendo mais visível em Lisboa e no Porto. A directoria de Faro, por sua vez, apresenta os mesmos dados que no ano passado.

Iguais tendências nos sequestros e raptos

O aumento do crime violento em Lisboa não se verificou apenas nos assaltos a bancos.

Tal como o PÚBLICO já noticiou, igual fenómeno verificou-se nos sequestros e raptos (cuja investigação também é da responsabilidade da Direcção Central de Combate ao Banditismo da Polícia Judiciária).

No primeiro semestre do ano passado, tinha havido 98 casos em Lisboa - este ano, foram 119.

O aumento foi de 15 por cento, enquanto no Porto a diminuição foi idêntica - o decréscimo foi de 14 por cento.

A percentagem de crimes resolvidos também cresceu.

Tinha sido de 40 por cento no primeiro semestre do ano passado, foi de 44,8 por cento este ano.

A maioria dos sequestros e raptos que se verificaram este ano foi também motivada pelo roubo.

Três por cento tiveram origem em redes criminosas, tendo crescido para 25 por cento os casos de situações falsas que são denunciadas às autoridades.

Paralelamente à aparente estagnação daqueles crimes (houve mesmo uma diminuição de um por cento), a Polícia Judiciária realça o aumento da violência utilizada