Boa parte do público apercebeu-se do
aparecimento desta nova modalidade de censura e, cada
vez mais, tem plena consciência da sua existência, até porque ela é por demais evidente.
Algumas notícias são tão patentemente lacunares em aspectos essenciais, que até
se tornam anedóticas. A tal ponto, que admito a hipótese de o jornalista que
elabora a notícia o fazer de forma a, intencionalmente, não só evidenciar as
lacunas, como usar palavras sugestivas daqueles que foi «incentivado» a omitir. Tal qual as descrições que me lembro de
ver, no pós-revolução, jornalistas fazerem da sua actividade no tempo da
censura prévia do Estado Novo. A palavra proibida é substituída por uma palavra
que a sugere. Ou, em vez disso, a notícia é elaborada de forma a ficar patente
que se encontra incompleta.
Dou dois exemplos recentes, relativos ao
mesmo evento – link 1; link 2.
É evidente que falta, em qualquer destas
notícias, um facto fundamental para o leitor compreender o que realmente se
passou. Em contrapartida, tudo indica que quem as escreveu quis dar a conhecer
esse facto através do fornecimento de outros que claramente o indiciam.
Assim, nesta
notícia, escreveu-se que quem destruiu o café foi uma «família» e não, por exemplo, um «grupo de pessoas»; nesta, o grupo de agressores também foi designado como
«família» e indica-se, como facto que
desencadeou a agressão, um desentendimento entre o «patriarca» dessa família e os responsáveis de um café.
A «palavra
proibida» («ciganos», obviamente)
nunca foi escrita, mas foram-no palavras que a sugerem de forma evidente. Tal
qual acontecia no tempo do Estado Novo, quando a notícia fosse escrita por um
jornalista mais atrevido, que quisesse pôr à prova a sagacidade e a atenção de
quem, então, desempenhava a odiosa tarefa do policiamento da palavra.
É neste ponto que nos encontramos. Há
quem viva muito bem com isto. Há, até, quem afirme que isto fortalece a
democracia, parecendo esquecer-se de que esta pressupõe a existência de
liberdade de expressão e de liberdade de informação.
Não é o meu caso. Vivo mesmo muito mal
com limitações à liberdade de expressão e à liberdade de informar e estou certo
de que as mesmas estão a minar a democracia. Amo demasiado a liberdade, o
conhecimento e a verdade, para me conformar com este estado de coisas.