2005-10-21

Greve dos Juízes

Mensagem enviada pela Direcção Nacional da Associação Sindical dos Juízes Portugueses a todos os seus associados:

Caros colegas
Está agendada para os próximos dias 26 e 27 a greve nacional dos juizes, que a Direcção da ASJP decretou na sequência do mandato que lhe foi conferido pela Assembleia Geral extraordinária do passado dia 18 de Junho. Todos sabemos e sentimos quais são as motivações que nos levaram a optar pela greve como manifestação colectiva de protesto, e que nos levam a mantê-la como forma de expressarmos a nossa indignação e revolta contra a política governamental na área da Justiça. Das férias judiciais aos SSMJ, do congelamento da progressão nas carreiras e suplementos remuneratórios ao incumprimento despudorado de compromissos escritos e firmados com a ASJP, tudo tem servido para alijar responsabilidades, para discriminar negativamente os juízes, e para agravar as cada vez mais difíceis condições de funcionamento dos Tribunais. O que está em causa, no entanto, excede em muito uma questão de índole meramente sindical ou 'corporativa'. O que está em causa é a própria credibilidade e o prestígio das instituições judiciárias, que se têm visto atacadas a coberto dum discurso populista e duma demagogia primária, propícios a criar na opinião pública um clima hostil à magistratura e que pode mesmo permitir, num futuro próximo, a subversão das regras constitucionais que garantem o equilíbrio e a separação dos poderes do Estado e a independência do poder judicial. Se assim não fosse, como explicar o contínuo amesquinhamento e degradação do estatuto profissional da magistratura, de forma acrítica mas sistemática, sem razões de fundo, nem sequer de mero cariz orçamental ou financeiro, que minimamente o pudessem justificar? Como explicar a completa marginalização dos juizes, que sempre manifestaram total disponibilidade para colaborar na busca de soluções que aproveitassem à melhoria do funcionamento do sistema? Como explicar a ausência de medidas de fundo que obviassem aos estrangulamentos existentes, e de que o fiasco da acção executiva é o mais triste exemplo, a troco de medidas pontuais e cosméticas, que não só passam de meros remendos condenados ao fracasso? Como explicar a postura governamental de cega arrogância e de desajeitado atropelo da legalidade, impensáveis num Estado de Direito democrático? Como explicar a instrumentalização das 'corporações' da Justiça, apresentadas à opinião pública como castas que beneficiam de injustificados privilégios, e que urge 'moralizar'? Ou será que é com uma Justiça desprestigiada, desmotivada, e desautorizada, que se pretende combater eficazmente os desafios que hoje se colocam à sociedade portuguesa, tais como a corrupção, a alta criminalidade económica, e as manobras obscuras de interesses poderosos, que não olham a meios para destruir direitos dos mais desfavorecidos? * O agendamento dos dias de paralisação fixou uma dilação que poderia permitir encontrar-se uma solução de consenso que obviasse à consumação da greve. Porém, às diligências empenhadas do Sr. Presidente da República, que são conhecidas, a que se seguiram outras da iniciativa dos Srs. Presidentes do S.T.J. e do S.T.A., relativamente às quais sempre manifestou a ASJP total abertura e disponibilidade, a resposta obtida do Governo foi só uma: arrogância, intransigência e imobilismo. Confirmando afinal, para quem ainda tivesse dúvidas, que as nossas motivações estavam mais que justificadas. Neste contexto, a greve, cuja legitimidade jurídico-constitucional foi confirmada pelo C.S.M., é para os juizes a única atitude adequada, possível, e coerente. Mas que fique bem claro: foi o Governo que empurrou os juizes para a greve, e é o Governo o primeiro responsável pela consumação da mesma. A hora que vivemos exige, mais que nunca, a unidade e a coesão de todos os juizes, em torno da defesa da dignidade da nossa função, do prestígio dos Tribunais, e da independência do poder judicial. É por isso que pessoalmente vos apelo à adesão a uma greve que não desejámos, mas que assumimos conscientemente e sem constrangimentos. A razão que nos assiste certamente acabará por prevalecer.
Cordiais saudações associativas,
Lisboa, 21 de Outubro de 2005.
O Presidente da Direcção Nacional da ASJP
Alexandre Baptista Coelho Juiz Desembargador